Diretiva MUD perpetua injustiças no streaming

Cinco anos depois da sua aprovação, a diretiva da União Europeia sobre o Direito de Autor no Mercado Único Digital (MUD) não trouxe justiça à economia do streaming. Apenas 2,27% dos músicos portugueses estão satisfeitos com as receitas que recebem das plataformas de streaming. No total 95,44 % consideram que a repartição dessas receitas não é justa.

A diretiva europeia aprovada em 2019 que teve como um dos seus objetivos principais trazer justiça na repartição de receitas no streaming, está longe de ser um sucesso, revela o estudo O Impacto da Diretiva MUD nos Artistas e Músicos da EU, recentemente publicado.

Envolvendo uma amostra de 9.542 artistas de 18 países europeus, dos quais cerca de mil portugueses, este estudo de opinião foi promovido em Portugal pela GDA, a entidade que gere em território nacional os direitos de propriedade intelectual de artistas intérpretes e executantes (atores, bailarinos e músicos), e coordenado a nível europeu pela AEPO-ARTIS (uma organização de artistas pan-europeia de que a GDA faz parte e que representa cerca de 700 mil artistas do audiovisual e música).

Este trabalho, que contou ainda com a colaboração da Organização Internacional dos Artistas (IAO), foi o maior estudo de opinião alguma vez levado a cabo em toda a UE sobre questões relacionadas com artistas da indústria musical. Os resultados da sondagem foram analisados pelo investigador independente da indústria musical, Daniel Johansson (Universidade de Ciências Aplicadas de Inland, Noruega).

O estudo completo pode ser descarregado aqui.

Além, de um elevado grau de insatisfação com as receitas auferidas, o estudo revela ainda que apenas 4,56% dos artistas portugueses considera justa a repartição das receitas do streaming. Ou seja, 95,44% considera-a injusta.

“Estes resultados não nos surpreendem”, afirma Pedro Wallenstein, presidente da GDA. Os valores relativos a Portugal contrastam com os de outos países, como a Suécia, onde 20,17% considera justa a repartição.

“Essas discrepâncias explicam-se com a qualidade díspar das transposições da diretiva em cada Estado-membro. Em Portugal, a transposição ficou muito aquém do espírito da diretiva, ao ter permitido que muitos artistas ficassem sem receber qualquer parcela dos rendimentos gerados pelas suas obras no mercado digital”, afirma Pedro Wallenstein.

Em junho de 2019, a UE adotou a diretiva sobre o Direito de Autor no Mercado Único Digital (“diretiva MUD”). No seu capítulo 3, reconheceu a posição frágil dos músicos e obrigou os Estados-membros da União a implementarem legislação que garantisse a todos os artistas uma remuneração justa.

Especificamente, essa legislação tem de garantir aos artistas direitos efetivos, nomeadamente o de receber uma remuneração apropriada e proporcional, obter informação transparente sobre a exploração das suas gravações, reivindicar uma remuneração adicional justa, recuperar direitos das companhias discográficas em certas situações e recorrer à resolução alternativa de litígios.

O estudo conclui que ainda existem lacunas na eficácia da legislação. Consequentemente, este relatório sugere a necessidade de medidas adicionais por parte da UE, dos Estados-membro e da indústria musical. “Espera-se que os dados apresentados sirvam como um catalisador para o desenvolvimento e implementação de tais medidas adicionais”, refere Daniel Johansson.

As principais conclusões ao nível da UE incluem:

  • Apenas 5,1% dos artistas inquiridos consideram a sua receita de streaming satisfatória, com disparidades significativas entre os Estados Membros.
  • Em relação à transparência, aproximadamente 77% dos artistas europeus da UE não receberam o nível de informação detalhada a que tinham direito legalmente.
  • Num grupo de 4.215 artistas que tentaram ajustar os seus termos contratuais para receber remuneração adicional, apenas 35 o conseguiram.
  • Apenas 5,9% dos artistas da UE tentaram recuperar os seus direitos e, desses, 69,4% não o conseguiram.
  • A possibilidade de resolução alternativa de litígios (projetada para evitar processos onerosos e minimizar a hostilidade entre as partes) foi pouco utilizada e, quando foi, a maioria dos artistas (60%) não a considerou útil.

Em relação aos músicos de sessão, que não recebem remuneração pelo streaming, o autor afirma que “uma vez que os músicos de sessão (executantes) não têm direito a qualquer remuneração resultante do streaming, é imperativo fornecer recomendações a nível da UE sobre a possibilidade de os Estados Membros introduzirem tal direito de remuneração.”

Ao completar a pesquisa, 1.228 artistas optaram por fornecer comentários sobre as suas carreiras e a indústria musical em geral. Uma análise ao tom desses comentários revelou que apenas 21 poderiam ser considerados positivos.

Apenas os governos dos Estados Membros da UE podem responder às inúmeras dúvidas dos artistas. É uma responsabilidade sua implementar legislações que tornem a diretiva MUD eficaz e este relatório mostra, sem sombra de dúvida, que até agora os governos falharam.

“Este estudo revela a necessidade premente de se reabrir na Europa e, especialmente em Portugal, a discussão em torno da diretiva”, enfatiza Pedro Wallenstein, presidente da GDA.

O Secretário-Geral da AEPO-ARTIS, Ioan Kaes, comenta: “Este relatório deveria ser leitura obrigatória para os governos nacionais em toda a UE e na restante Europa (incluindo o Reino Unido). Os legisladores devem olhar para o impacto diminuto desta diretiva e proceder às mudanças legislativas necessárias para garantir que o objetivo principal da diretiva – remuneração justa – seja alcançado.”

Diretiva MUD: Bélgica assegura proteção dos artistas

A Bélgica transpôs diretiva MUD garantindo aos artistas o direito a uma remuneração pela exploração online dos seus trabalhos. O diploma vai ao encontro do que a GDA defende para Portugal.

O Parlamento belga transpôs a diretiva sobre os Direitos de Autor no Mercado Único Digital (2019/790, também conhecida como diretiva MUD) com uma ampla maioria, tendo a posição dos artistas intérpretes ou executantes, saído reforçada.

O diploma, aprovado a 16 de junho, acrescenta dois novos direitos de remuneração para artistas cujo trabalho musical e audiovisual seja explorado pelas plataformas digitais.

Um desses direitos aplica-se às plataformas de conteúdo gerado pelo utilizador e o outro às plataformas de streaming comercial, ambos os direitos são irrenunciáveis.

A nível internacional, a AEPO-ARTIS, organização europeia que congrega 36 entidades de gestão coletiva de direitos e da qual a GDA é fundadora, já agradeceu ao Governo da Bélgica por ter “modernizado a sua Lei de Direitos de Autor da forma correta”, ao adaptar a sua legislação de forma a assegurar uma melhor proteção dos artistas e autores no ambiente digital.

Recorde-se que a diretiva defende que os artistas intérpretes ou executantes devem ter direito a receber uma remuneração adequada e proporcional pela exploração online dos trabalhos em que participam.

“Ao contrário da proposta que, em Portugal, temos em cima da mesa para a transposição da diretiva e que foi herdada do executivo anterior, a legislação aprovada na Bélgica inclui os artistas na repartição de receitas geradas pelo seu trabalho nas plataformas digitais”, comenta Pedro Wallenstein, presidente da GDA.

Proposta em outubro pelo Governo que, entretanto, cessou funções, essa transposição minimalista ignora as recomendações explícitas da diretiva ao excluir liminarmente os artistas intérpretes e executantes de “uma remuneração adequada e proporcional” pela utilização online das obras em que participaram.

A proposta acabou por não ser votada, devido à dissolução da Assembleia da República.

Tal como a Bélgica, Portugal está sob pressão da Comissão Europeia para transpor a diretiva para a legislação nacional. A GDA tem apelado ao ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, para reformular a proposta da sua antecessora por excluir a maioria dos artistas portugueses do Mercado Único Digital, impedindo-os de receberem um pagamento justo pela utilização online das suas obras”, razão pela qual “não pode servir de base à transposição da diretiva.”

O diploma agora aprovado na Bélgica vai ao encontro do que a GDA defende para Portugal:

  • O direito de os artistas receberem uma remuneração pela utilização das obras em que participam nas plataformas de conteúdo gerado pelo utilizador (casos do Youtube, Twitch e TikTok, entre outras).
  • A garantia de uma remuneração para toda e qualquer prestação artística quando explorada nas plataformas de streaming como o Spotify, Apple Music ou Netflix.

As companhias discográficas contestam a medida e alegam que ela vai acabar com as atividades musicais na Bélgica, o que não se verificou em qualquer dos estados que já adoptaram legislação semelhante.

Pierre-Yves Dermagne, vice-primeiro ministro belga e ministro da Economia, defende a opção: “O acréscimo de direitos de remuneração pela exploração online foi feito a pedido dos artistas”, afirma. “Dá-lhes poderes para receberem efetivamente uma remuneração. Durante a próxima presidência belga da União Europeia, em 2024, queremos fazer um esforço para generalizar este sistema em toda a União”.

Na perspetiva de Pedro Wallenstein, “a transposição da Diretiva MUD para a legislação portuguesa irá viabilizar ou matar, as condições de possibilidade da vida artística no Portugal digital do futuro”. Por isso, a GDA apela aos deputados e ao ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, que olhem para o exemplo belga e revejam a proposta herdada da legislatura anterior. “Os artistas só exigem o que os órgãos da União Europeia pedem que lhes seja dado: justiça e proporção”, conclui.

Mercado digital em Portugal não pode ignorar as recomendações europeias

O Parlamento Europeu e a Comissão Europeia legislaram para que os artistas do espaço europeu possam receber um pagamento justo pela utilização online das suas obras. Conheça os argumentos da GDA neste artigo de opinião assinado por Pedro Wallenstein

Um artigo de opinião de Pedro Wallenstein, presidente da GDA*

Viver em plena transição digital, construindo todos os dias a nova sociedade do conhecimento, tem as suas dificuldades. Que o digam os órgãos de comunicação social, que só têm acesso a uma pequena parte das receitas que geram na Web, onde hoje são vistos, ouvidos e lidos pelos cada vez mais numerosos espetadores, ouvintes e leitores que os acompanham minuto a minuto.

Que o digam também os autores, que da previsibilidade da remuneração que lhes era prestada no mundo analógico, passaram, hoje, à incerteza de verem o essencial das receitas geradas pelo seu trabalho ficarem nas mãos de quem domina as plataformas e os mercados digitais.

E que o digam, sobretudo, os artistas!

Apesar de o “online” estar a gerar as maiores receitas de sempre para a música e para o audiovisual, apenas os intérpretes musicais recebem uma questionável parcela das receitas originadas pela utilização do seu trabalho. Os executantes musicais e a generalidade dos atores e dos bailarinos não recebem nada – rigorosamente nada! – pelo produto gerado online com o seu trabalho e o seu talento.

Foi por a situação ser esta que o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia legislaram para que os artistas do espaço europeu (tal como os autores e os média) possam receber um pagamento justo pela utilização online das suas obras. A Diretiva do Mercado Único Digital (MUD), a Diretiva MUD, quer garantir que a exploração online das obras musicais e audiovisuais seja uma fonte de rendimento justa e proporcionada para todos os artistas, intérpretes e executantes titulares de direitos.

A GDA – Gestão dos Direitos dos Artistas, a entidade que em Portugal gere os direitos de propriedade intelectual de atores, bailarinos e músicos, lançou uma campanha a propósito da transposição para a ordem jurídica nacional da Diretiva MUD que, quanto mais não seja, teve a virtude de contrariar alguma apatia e resignação do nosso sector cultural e criativo nesta matéria. A GDA representa em Portugal perto de 15 mil atores, bailarinos e músicos por mandato direto – e mais de um milhão ao abrigo dos contratos de reciprocidade internacional.

A GDA tem procurado ancorar as suas posições nas fontes mais credíveis e equidistantes possível, assumindo posições que, sem nunca perder de vista os compromissos e o alinhamento com as federações e associações internacionais em que se insere, são das mais moderadas e conciliadoras desse universo. Aliás, não existe da sua parte intenção de impor o modelo da gestão coletiva: a gestão coletiva, em si, é uma mera ferramenta que pode ser usada para atingir os objetivos previstos na Diretiva, assegurando a justa remuneração de certos artistas que, sem ela, ficariam excluídos do Mercado Único Digital.

Nesta Diretiva, como aliás em qualquer outra, o articulado principal representa o patamar mínimo, a “linha vermelha” abaixo da qual nenhum estado-membro pode descer. E tão, ou mesmo mais, importantes do que este articulado, são os considerandos que o precedem. Ora, nenhuma das propostas apresentadas pela GDA em sede de audição pública extravasa o teor dos considerandos, nem ultrapassa a margem de manobra que eles concedem aos estados-membros.

No entanto, o texto enviado pelo Governo à Assembleia da República reitera a opção por uma transposição minimalista e “ipsis verbis”, traindo o espírito da Diretiva europeia e confirmando o cínico preceito que Lampedusa imortalizou no seu Il Gattopardo: “Alguma coisa deve mudar para que tudo fique na mesma”.

Todavia, a legislação nacional sobre o mercado único digital não poderá ignorar as recomendações do Parlamento Europeu sobre a situação dos artistas e a recuperação cultural da União Europeia. Dos 45 pontos sobre a política cultural da União, oito são expressamente dedicados à Diretiva MUD e estão em consonância com as posições que a GDA vem assumindo: recolheram os votos a favor de todo o espectro político português representado no Parlamento Europeu.

É verdade que não existem para Portugal estudos rigorosos sobre a realidade digital da música e do audiovisual. Mas podemos assumir que, salvo particularidades, as realidades nacionais acompanham o mundo globalizado nas suas tendências genéricas. Neste sentido, recomendamos às partes interessadas três documentos produzidos por entidades de insuspeita idoneidade, equidistância e rigor científico e político.

 O relatório da Comissão “Digital, Cultura, Média e Desporto” do Parlamento britânico é um deles. O Parlamento britânico ouviu e analisou exaustivamente os depoimentos de criadores, peritos do sector, serviços de streaming, músicos, editoras discográficas e empresas tecnológicas, tendo produzido conclusões que estão em linha, ou vão mesmo além, das teses defendidas pela GDA.

Outro é o estudo da Organização Mundial da Propriedade Intelectual – OMPI (agência das Nações Unidas com sede em Genebra) “The Artists in the Digital Music Marketplace: Economic and Legal Considerations”. Este estudo, confirmando muitos dos argumentos da GDA, fornece um riquíssimo manancial de dados e informações sobre a diversidade de pontos de vista, terminando com um quadro comparativo dos prós e contras das várias soluções possíveis.

Também a compilação de relatórios, guias e ferramentas editada pelo Fórum dos “Managers” Musicais – MMF, sob o título “Dissecting the Digital Dollar”, mostra como a análise e os dados estatísticos avançados por uma das mais relevantes organizações internacionais de empresários musicais coincide com a dos artistas portugueses.

Resumindo e concluindo: a transposição da Diretiva MUD irá viabilizar, ou matar, as condições de possibilidade da vida artística no Portugal digital do futuro.

A GDA apela por isso aos deputados e ao ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, que revejam a proposta que está em cima da mesa e que, no pouco tempo que há disponível para transpor a Diretiva MUD, voltem a ouvir os representantes dos artistas, dos autores e dos órgãos de comunicação social.

Os artistas só exigem o que os órgãos da União Europeia pedem que lhes seja dado: justiça e proporção.

*Publicado, na edição de 13 de junho de 2022, do jornal Público

GDA quer ser ouvida pelo Governo antes da transposição da Diretiva MUD

A Diretiva do Mercado Único Digital – com que a União Europeia impõe que o “streaming” de música e de audiovisual seja um rendimento justo para intérpretes e executantes – está atrasada mais de um ano em Portugal. Agora, tem de ser transposta em dois meses! Para os artistas portugueses, a proposta do anterior Governo “trai por completo” o espírito da Diretiva europeia. Apelam ao novo ministro da Cultura que “não os exclua do mercado digital!”

A GDA – Gestão dos Direitos dos Artistas apela ao novo ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, e aos deputados da Comissão Parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, para que oiçam os artistas nacionais antes de transporem para Portugal a diretiva europeia dos direitos de autor e direitos conexos para o Mercado Único Digital (MUD). Segundo a GDA – a entidade que gere em Portugal os direitos de propriedade intelectual de atores, bailarinos e músicos – a proposta herdada do anterior Governo “exclui os artistas portugueses do Mercado Único Digital, impedindo-os de receberem um pagamento justo pela utilização online das suas obras”, razão pela qual “não pode servir de base à transposição da diretiva.”

A urgência deste apelo prende-se com a notificação por Bruxelas, no passado dia 19 de maio, de “pareceres fundamentados” no âmbito do processo de infração movido a Portugal por ainda não ter transposto a Diretiva MUD aprovada em 2019 pelo Parlamento Europeu e pela Comissão Europeia. A notificação da semana passada obriga, agora, a que o Governo e o Parlamento portugueses tenham de fazer em apenas dois meses a transposição para a ordem jurídica nacional dessa legislação europeia que procura garantir que a exploração online – nomeadamente o “streaming” das obras musicais e audiovisuais – seja uma fonte de rendimento justa e proporcionada para todos os artistas, intérpretes e executantes titulares de direitos.

“A GDA apela ao ministro Pedro Adão e Silva e aos deputados que a transposição da Diretiva MUD garanta duas coisas simples: que os artistas que hoje recebem pouco pela utilização online das suas obras passem a receber mais, de uma forma justa e proporcionada; e que a maioria dos artistas, que nada recebe, passe a receber direitos sempre que as obras em que participa gerem receitas no online”, afirma Pedro Wallenstein, presidente da GDA.

“Ora, o texto que o anterior Governo deixou em 2021 na Assembleia da República não garante nada disso. Pelo contrário! Trai completamente o espírito da Diretiva e quer perpetuar em Portugal o atual desequilíbrio em desfavor dos artistas, não só ignorando todos os contributos e propostas atempadamente apresentadas pela GDA, como até eliminando completamente do articulado a expressão “artistas, intérpretes ou executantes”, excluindo-os na prática do Mercado Único Digital”, sublinha Pedro Wallenstein.

Já no início de abril, quando o Governo tomou posse, a GDA escreveu uma carta ao novo ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, pedindo-lhe que a transposição da Diretiva MUD para a lei portuguesa respeitasse os propósitos políticos de justiça e de equidade que estiveram no espírito dos deputados e dos comissários europeus.

“O negócio streaming, tal como está, é injusto para os artistas!”

“O Parlamento Europeu e a Comissão Europeia legislaram precisamente para tornar equilibrada e minimamente justa a repartição das receitas do mercado digital”, recorda Pedro Wallenstein. E chama a atenção para o exemplo da França, a qual, no dia 12 deste mês, anunciou um ‘acordo histórico’ entre as organizações de artistas intérpretes e os produtores fonográficos no mercado streaming francês, “garantindo, não só uma remuneração aos artistas, como passou a incluir os artistas executantes, pela primeira vez na história, na repartição das receitas online”.

Este acordo em França (ver comunicado da ADAMI aqui) prova, para o presidente da GDA, uma coisa clara: “O negócio streaming, tal como está – com uma média de apenas 10% das receitas online para os artistas, ficando as editoras com cerca de 60% do dinheiro e as plataformas com perto de 30% – é profundamente mau e terrivelmente injusto para os artistas!”

Entretanto, também a Bélgica se prepara para a aprovação, no respetivo Parlamento, de uma solução que estabelece uma remuneração irrenunciável, a ser cobrada pelas entidades de gestão dos direitos dos artistas que garante uma remuneração justa e equitativa para a exploração digital de obras musicais e audiovisuais.

Por isso, conclui Pedro Wallenstein, a proposta do anterior Governo que está na Assembleia da República “deixa tudo na mesma, traindo totalmente os propósitos da Diretiva MUD: não é uma base aceitável para fazer a transposição da diretiva em Portugal!”

Vídeos da GDA denunciam injustiças na economia do streaming

A GDA lançou uma campanha de esclarecimento sobre as injustiças na economia do streaming e bate-se por uma legislação que não exclua os artistas.

Com a nova legislatura, a transposição para a lei portuguesa da Diretiva sobre os Direitos de Autor no Mercado Único Digital volta a estar na ordem do dia. A GDA lançou uma campanha que inclui três vídeos, através dos quais ficam bem explicadas e esclarecidas as injustiças na distribuição das receitas geradas pelas grandes plataformas de streaming. Conheça aqui os vídeos e os factos.

 

Este é o terceiro e último vídeo da campanha da GDA em prol de uma maior justiça na distribuição das receitas do streaming. O primeiro foi publicado a 27 de abril e pode ser visionado aqui. O segundo, divulgado no dia 4 de maio, está aqui e na redes sociais da Fundação GDA. No site streamingjusto.pt pode encontrar uma compilação de todos os factos em torno da “economia do streaming”.

Esta campanha visa esclarecer a opinião pública sobre uma situação injusta e até irracional na chamada economia do streaming, que deixa a maioria dos artistas de fora.

Além de esclarecer sobre a desproporção na distribuição de receitas, o a GDA pretende é uma solução que passe por uma transposição da Diretiva fiel ao espírito e à letra desse diploma.

A principal solução para corrigir esse desequilíbrio é garantir que, quando se transpuser a diretiva para a legislação portuguesa, se faça de maneira a refletir o espírito da Diretiva, cujo texto original reconhece que “os autores e artistas intérpretes ou executantes costumam estar numa posição contratual mais fraca quando concedem uma licença ou transferem os seus direitos”.

Por isso mesmo, o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia entenderam que “a diretiva deverá prever a proteção dessas pessoas singulares para que as mesmas possam beneficiar plenamente dos direitos harmonizados por força do direito da União”.

A GDA defende uma transposição fiel não só à palavra, mas sobretudo ao espírito da Diretiva, permitindo uma distribuição adequada, justa e equitativa das receitas geradas através do streaming, baseada nos seguintes alicerces:

  1. Regular juridicamente o mercado digital;
  2. Não criar desfasamento entre a regulação do mundo analógico e do mundo digital;
  3. Instituir uma gestão equilibrada dos direitos para todas as partes no Mercado Único Digital.

Na sua luta em prol de uma transposição equilibrada da Diretiva sobre o Mercado único digital, a GDA desenvolveu um trabalho de compilação e sistematização de informação com o propósito de instruir, clarificar e desmistificar o Mercado Único Digital e reforçar a urgência da transposição da Diretiva para Portugal, tendo criado o site Streaming Justo, contribuindo com a difusão de informação credível e rigorosa para fundamentar as suas posições em prol da defesa dos interesses dos artistas intérpretes e executantes.

Parlamento britânico pede reestruturação do mercado digital para garantir pagamento justo aos músicos

O Parlamento britânico apresentou ao Governo do Reino Unido um manual de recomendações para regulamentar o mercado digital, de forma a que os músicos possam receber uma remuneração justa e equitativa pela utilização das suas obras na internet. As conclusões apresentadas vêm reforçar as propostas que a GDA – Gestão dos Direitos dos Artistas enviou ao Governo e à Assembleia da República para a transposição para a lei portuguesa da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa para os direitos de autor e direitos conexos no Mercado Único Digital (MUD).

“Economics of Music Streaming” é o nome do relatório apresentado no dia 14 de julho, elaborado pela comissão parlamentar Digital, Cultura, Média e Desporto (DCMS), que revelou “profundas preocupações” pelo facto do mercado de streaming ser dominado pelas grandes plataformas como a Spotify, Apple, YouTube e Amazon Music e completamente desfavorável aos músicos.

A comissão sugere um “reset” da indústria de streaming para que também os músicos possam ser beneficiados e para que o mercado digital passe a ser sustentável. Foi recomendada ao Governo britânico a criação de mecanismos que possam tornar os algoritmos e as playlists mais transparentes para facilitar a métrica do consumo das músicas no mercado digital.

“É importante para a GDA verificar que um dos maiores mercados da indústria musical partilha a mesma posição relativamente às medidas a serem adotadas para equilibrar a distribuição das receitas no mercado digital” afirma Luís Sampaio, vice-presidente da GDA. “Em Portugal é fundamental que a transposição da Diretiva MUD seja feita o mais breve possível e que acabe com a situação atual, na qual as grandes editoras ganham milhões de euros e os músicos pouco ou nada recebem”.

Segundo o relatório, verifica-se atualmente uma situação também insustentável e desequilibrada no Reino Unido quando se fala na divisão das receitas pela exploração e utilização da música nas plataformas de streaming. “Para as editoras, a indústria da música está a prosperar: entre 2015 e 2019, a indústria de streaming impulsionou em 21% o volume de negócios das principais editoras do Reino Unido e a margem de lucro operacional aumentou de 8,7% para 11,8%. No entanto, as receitas que os músicos receberam não tiveram um aumento proporcional”.

Um estudo da #PayPerformers de 2020 sobre a remuneração de streaming no Reino Unido evidencia que o modelo atual é absolutamente insustentável para os músicos.

Remuneração das plataformas de streaming aos músicos do Reino Unido em 2020. Fonte: House of Commons

No mesmo relatório, a cantora e compositora britânica, Nadine Shah falou sobre o impacto da baixa remuneração no mercado digital: “Como artista com um perfil reconhecido, com uma base de fãs substancial e aclamada pela crítica, não ganho dinheiro suficiente com o streaming. Encontro-me numa posição em que estou a lutar para pagar a minha renda e sinto-me envergonhada de falar sobre estas questões publicamente. Tenho vergonha de falar sobre isso por várias razões até porque, até certo ponto, o dinheiro é uma indicação de sucesso, mas não estou a ser paga de uma forma justa pelo trabalho que faço. Muitas vezes os artistas são encorajados a não fazer estas perguntas”.

Dados sobre a distribuição de receitas mostram que, depois do pagamento de impostos, apenas 16.5% das receitas chegam aos músicos. (ver tabela 2)

 

Distribuição das receitas (depois do IVA). Fonte: House of Commons

A comissão parlamentar recomenda que o “Governo proporcione aos músicos o direito a uma remuneração equitativa”, através de uma lei que garanta a divisão das receitas geradas em partes iguais: 50% para as editoras e os outros 50% para os músicos. Um modelo semelhante ao que existe para a televisão e para a rádio, em que as receitas são geradas pela transmissão e não pela venda, como acontece com as lojas físicas e downloads, nos quais se obtém o “direito de propriedade”.

As plataformas de streaming tentam cada vez mais aproximar os seus serviços aos da rádio para conseguirem captar os seus ouvintes. Um dos mecanismos utilizados como estratégia para migrar os ouvintes para o streaming é a reprodução automática e personalizada das músicas: um modelo que se aplica quando o utilizador de streaming para de selecionar ativamente o que quer ouvir e são os sistemas de recomendação que selecionam as faixas que serão ouvidas. 

Dawn Ostroff, Diretora de Negócios de Conteúdo & Publicidade do Spotify, admitiu precisamente que “o objetivo é tirar ouvintes da rádio” e encarar como uma oportunidade de negócio os 30 biliões de dólares em receitas de publicidade direcionados a essa indústria.

A sustentabilidade da rádio foi também expressa como uma preocupação da BBC neste relatório, ao alertar que o streaming de música é um desafio crítico para o consumo de rádio no serviço público de radiodifusão, particularmente devido a ferramentas como alto-falantes inteligentes – como a Siri ou a Alexa Amazon – ou por sistemas de hardware nos automóveis.

Conheça as conclusões e recomendações do Parlamento britânico (tradução para português)

ou

Consulte aqui o Relatório completo  (original)

Rolling Stones, Van Morrison, Barry Gibb e Tom Jones juntam-se ao movimento por um streaming justo

Os Rolling Stones, Pet Shop Boys, Emeli Sandé, Barry Gibb, Van Morrison, Tom Jones e os herdeiros de John Lennon e Joe Strummer escreveram ao primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, reivindicando medidas que introduzam justiça na distribuição das receitas do streaming de forma a devolver uma parte do valor da música a quem a faz – os músicos.

Afirmando estarem a escrever em “prol da atual geração de artistas, músicos e compositores”, estes artistas tiveram um gesto de solidariedade sem precedentes ao juntarem os seus nomes à carta subscrita em abril por outros 156 artistas, entre os quais Annie Lenox, Paul McCartney, Melanie C, Jimmy Page, Boy George, Noel Gallagher e Kate Bush.

Com estes novos nomes, o movimento no Reino Unido junta agora todos os artistas cujos discos Boris Johnson disse, num programa da BBC, que levaria para uma ilha deserta.

Este novo apelo surgiu dias depois de a Organização Mundial para a Propriedade Intelectual (OMPI), ter divulgado, a 1 de junho, um estudo sobre os “Artistas no Mercado Digital de Música”.

A OMPI afirma que a distribuição das receitas no mercado digital é um “problema sistémico que e exige uma solução sistémica” e conclui que o streaming deve começar a pagar aos artistas como a rádio. “Quanto mais as receitas globais aumentam, mais dificuldade os artistas têm em compreender porque o atual desequilíbrio é justo – porque não o é”, refere o estudo, salientando que a “remuneração do streaming deveria ser considerada uma comunicação pública”.

Tanto a carta dos artistas britânicos como o estudo da OMPI, reforçam a argumentação da GDA de que é urgente o Governo português transpor a Diretiva Europeia sobre os direitos de Autor no Mercado Único Digital (Diretiva MUD) para a legislação nacional.

O streaming explodiu, mas a legislação não acompanhou o ritmo da evolução tecnológica. Dai resulta que o trabalho de artistas intérpretes e executantes não goze da proteção que tem, por exemplo, na rádio. A maioria dos intérpretes recebe uma ínfima fração de cêntimo por cada stream, ao passo que os executantes não recebem nada.

Nos últimos meses, a GDA efetuou várias diligências junto do Governo e do Parlamento no sentido de a transposição da Diretiva MUD garantir aos artistas “o pagamento pela utilização das suas obras nas grandes plataformas digitais”, tendo inclusivamente apresentado uma proposta de transposição.

A GDA enviou essa proposta para o Ministério da Cultura, para o gabinete do primeiro-ministro e para a Presidência da República, assim como para os grupos parlamentares da Assembleia da República.

As plataformas, juntamente com produtoras e editoras fonográficas, apropriam-se de cerca de 93% das receitas geradas.

“Essa situação é intolerável, e sobretudo insustentável, numa altura em que, com a pandemia da Covid-19, os músicos, atores e bailarinos ficaram sem as receitas dos espetáculos ao vivo. Ao mesmo tempo, a utilização digital das suas prestações está a gerar as maiores receitas de sempre nas grandes plataformas e multinacionais de produção e edição, enquanto, para os artistas, sobram migalhas”, afirma Pedro Wallenstein, presidente da GDA.

Além das diligências junto do poder político, a GDA lançou, em maio, através das redes sociais a campanha #goodMUD para sensibilizar a opinião pública no sentido de esta apoiar uma transposição da diretiva que não deixe os artistas de fora.