IMARA: uma nova aliança global em defesa dos artistas musicais

Os artistas musicais dispõem de uma nova organização global para a defesa dos seus direitos. A IMARA – International Music Artists Rights Alliance nasceu para enfrentar desafios como a remuneração justa no streaming, a proteção dos direitos conexos no audiovisual e a regulamentação da inteligência artificial.

No passado dia 27 de fevereiro, foi oficialmente constituída a IMARA – International Music Artists Rights Alliance, uma nova federação internacional dedicada à defesa dos direitos dos artistas musicais. A sessão decorreu na sede da AIE, sociedade de gestão coletiva dos músicos em Espanha, em Barcelona, e contou com a presença de representantes de diversas entidades internacionais, incluindo a GDA, representada por Claudia Cadima.

A IMARA nasce para enfrentar desafios como a remuneração justa no streaming, a proteção dos direitos conexos dos músicos no audiovisual, e a regulamentação da inteligência artificial. A sua estrutura de governação assegura representatividade global, sendo a presidência assumida por Annie Morin (ARTISTI, Canadá) e a direção-geral por José Luís Sevillano (AIE, Espanha).

Diálogo e convergência estratégica

A adesão da GDA à IMARA cumpre o mandato aprovado na última Assembleia Geral, onde foi sublinhada a necessidade de coerência entre as soluções defendidas internamente e externamente. A GDA assume, assim, um papel ativo na promoção do diálogo e da convergência estratégica entre as organizações que representam artistas, reforçando a sua capacidade de intervenção na defesa dos direitos dos artistas a nível global. Esta abordagem, destacada pela Direção na Assembleia, sustenta a importância de um alinhamento concertado entre a IMARA e a GAVA (Global Audiovisual Alliance), garantindo uma resposta coordenada a desafios emergentes.

A decisão de integrar a IMARA segue a lógica da anterior adesão da GDA à GAVA, igualmente aprovada por unanimidade. A GAVA iniciou recentemente a sua atividade e encontra-se ainda num processo de afirmação e consolidação.

Dar globalmente voz aos artistas

Tanto a IMARA como a GAVA distinguem-se das restantes estruturas internacionais de que a GDA faz parte por serem alianças essencialmente políticas, concebidas para dar voz exclusiva aos artistas intérpretes e executantes. São compostas exclusivamente por entidades que representam artistas, o que lhes permite adotar uma perspetiva centrada nos seus direitos e interesses. Essa composição diferencia-as de outras plataformas onde estão representadas entidades mistas que representam simultaneamente artistas e produtores.

Na Europa, a AEPO-ARTIS continua a desempenhar um papel relevante nesta frente, embora integre igualmente sociedades mistas. A IMARA e a GAVA, por sua vez, representam um espaço de afirmação independente da voz dos artistas a nível global, criando condições para uma intervenção autónoma e estratégica e — desejavelmente — coesa face aos desafios que hoje se colocam ao setor.

Com sede em Londres, a IMARA prevê a entrada futura de entidades da América Latina e de África. Para a GDA, esta dimensão internacional visa, em última instância, contribuir para a afirmação dos direitos dos artistas, assegurando que possam ser reconhecidos e exercidos, independentemente do país onde o artista via ou do local onde os seus direitos tenham sido gerados.

MODE: o programa que incentiva artistas a declarar repertório não para de crescer

O Programa MODE tem vindo a consolidar-se enquanto incentivo à declaração de repertório por parte dos artistas intérpretes e executantes.

Promovido e executado em parceria entre a GDA e a Fundação GDA com o intuito de estimular o registo de repertório musical recente e, assim, contribuir para que os artistas sejam devidamente remunerados pela utilização pública das suas prestações artísticas, o MODE evoluiu de uma forma expressiva, como atestam o aumento da participação dos artistas e a valorização financeira do incentivo.

Entre 2020 e 2024, o programa registou um crescimento significativo. O número de declarações de participação aumentou 22%, atingindo um pico em 2022 e estabilizando, desde então, acima das 13.500 declarações anuais.

A partir de 2022, a introdução no MODE de álbuns disponibilizados exclusivamente em plataformas digitais, a par das obras físicas, impulsionou ainda mais a ampliação do repertório declarado. Assim, o número de álbuns referenciados para o programa teve um crescimento de 37% no total de álbuns referenciados.

Outro crescimento impressionante (83%) foi o das faixas extraídas para monitorização áudio, que atingiram um pico de 5.704 em 2024. É a monitorização dessas faixas pela GDA que permite identificar a sua utilização pública, assegurando a correta cobrança e distribuição dos direitos devidos aos artistas.

Em crescimento está também o número de artistas que beneficiaram do incentivo, tendo aumentado de 923, em 2020, para 1.112, quatro anos depois e também do incentivo médio pago aos artistas.

Estes dados podem ser analisados com mais detalhe nas infografias que acompanham este artigo.

Declarar o repertório: um passo essencial para os artistas

Desde a sua primeira edição, o MODE’08 (relativo a obras editadas em 2008) que o grande objetivo por trás deste programa é incentivar os artistas intérpretes e executantes a declararem o seu repertório. Essa declaração é o passo fundamental para que possam receber rendimentos provenientes dos direitos conexos que as suas obras geraram. Ou seja, para serem remunerados pela utilização das suas gravações em rádios, televisões e outros meios públicos. “Sem este registo, torna-se impossível à GDA cobrar e distribuir os montantes devidos a cada músico”, explica Luís Sampaio, vice-presidente da GDA.

Ao longo dos últimos anos, tem-se tornado evidente a necessidade de os artistas assumirem um papel cada vez mais ativo na proteção dos seus direitos e a declaração de repertório é o que está no cerne do desempenho desse papel. No atual cenário da indústria musical, onde os formatos digitais e as plataformas de streaming ganharam um peso significativo, o controlo sobre o repertório registado é essencial para que os músicos não fiquem para trás no sistema de distribuição de direitos. “A declaração do repertório constitui um ato essencial para a proteção do trabalho artístico. É através deste registo que se garante que intérpretes e executantes recebam aquilo a que têm direito, evitando que os seus direitos sejam negligenciados num sistema que depende da informação disponibilizada”, acrescenta Luís Sampaio.

MODE: Um Programa em crescimento e adaptação

Os números dos últimos cinco anos demonstram que o MODE não só tem crescido de forma sustentada, como também tem sabido adaptar-se às novas realidades da indústria musical. O aumento expressivo das declarações de participação e do repertório monitorizado confirma que mais artistas estão a tomar consciência da importância deste processo e a garantir a proteção dos seus direitos. 

A inclusão de álbuns digitais a partir de 2022 mostrou-se uma decisão estratégica, acompanhando as novas tendências do mercado. O aumento de mais de 100% no número de álbuns digitais declarados entre 2022 e 2024 prova que os artistas estão cada vez mais atentos às formas de registar e valorizar o seu trabalho. 

Além disso, a valorização dos incentivos atribuídos aos músicos em 2024, resultante de um aumento do orçamento do programa dos 200.000 € para 300.000 €, reflete um compromisso contínuo da GDA e da sua Fundação em assegurar que os artistas recebem um reconhecimento financeiro justo. O crescimento do incentivo médio pago aos intérpretes e executantes mostra que o MODE evoluiu de mecanismo de incentivo à declaração de repertório para uma ferramenta que fortalece a sustentabilidade da atividade musical. 

A evolução do MODE nos últimos anos mostra um caminho claro: mais artistas a registar o seu repertório, um acompanhamento mais eficiente da utilização das suas interpretações e uma maior valorização dos seus direitos.

Ao longo da sua existência, o MODE revelou-se um instrumento de consciencialização dos artistas para os seus direitos enquanto intérpretes e executantes. 

Music360: uma plataforma para descobrir o valor da música

Composta por seis organizações europeias e financiada por fundos comunitários, a plataforma Music360 vai avaliar a forma como a música ambiente, utilizada em espaços públicos, é valorizada e compensada. A GDA – Gestão dos Direitos dos Artistas é parte deste projeto.

Criado por um consórcio de especialistas em música, académicos e stakeholders da indústria, o projeto Music360, financiado pelo programa de investigação e inovação Horizonte Europa, utiliza tecnologia para monitorizar a música tocada em locais como cafés, bares, lojas ou centros comerciais e desenvolve metodologias e protocolos para medir o valor criado pela utilização da música.

A GDA faz parte deste consórcio que reúne várias entidades europeias de gestão coletiva de direitos de artistas, universidades e empresas de engenharia.

A música tocada em lojas, bares, restaurantes e outros espaços públicos gera valor económico, social e cultural. Este fator é visível não só na experiência em loja dos clientes, como na satisfação e produtividade dos funcionários, contribuindo ainda para o aumento das receitas desses negócios. Ao mesmo tempo, a música é uma importante fonte de receitas para os criadores, intérpretes e outros titulares de direitos. Um dos objetivos centrais do Music360 é estabelecer um sistema de remuneração transparente e justo para os detentores desses direitos.

Impacto cultural, social e económico 

O Music360 pretende ser uma ferramenta de monitorização e de valorização da música. Ao implementar uma abordagem que combina tecnologia, análise de dados e um profundo conhecimento do impacto cultural, social e económico da música, o projeto pretende garantir que os músicos titulares de direitos sejam pagos de forma mais justa pela utilização pública do seu trabalho.

Em fase de investigação, o projeto centra-se nas utilizações profissionais da música no comércio a retalho, na hotelaria, em bares e discotecas, bem como noutros locais públicos.

Em Portugal, o Music360 está a dar o pontapé de saída para uma distribuição mais justa de direitos conexos, baseada no uso real de música. A GDA, com a cooperação valiosa da Audiogest, já instalou, em vários bares e discotecas, de norte a sul do país, dispositivos que monitorizam e identificam as músicas que aí são tocadas. Cruzados os dados recolhidos com os existentes nas bases de dados da GDA, será possível identificar com rigor os artistas que participaram nessas obras e atribuir-lhes os direitos de forma ainda mais eficiente.

“A música vai muito além do simples entretenimento: faz parte do nosso tecido cultural e contribui para a atmosfera e a experiência emocional em espaços públicos. No entanto, os criadores não são frequentemente compensados de forma justa por essa exploração comercial da sua música”, afirma Bruno Gaminha, diretor de Distribuição da GDA, investigador desta no projeto.

“O nosso objetivo é contribuir para resolver esta situação, através do desenvolvimento de um sistema que rastreie a utilização da música em tempo real e garanta direitos transparentes e justos”, explica.

A música pode moldar a sociedade

O Music360 não tem como objetivo único medir o impacto económico da música. Este projeto explora em profundidade o valor da música num ecossistema amplo, abordando influências culturais, sociais, psicoemocionais e terapêuticas. A iniciativa destaca como a música pode moldar a sociedade, contribuir para a saúde emocional e agir como uma fonte de conexão e transformação cultural.

“Ao reconhecer e recompensar o verdadeiro valor da música, não estamos apenas a apoiar os artistas, mas todo um ecossistema que inclui consumidores e profissionais da música”, conclui Bruno Gaminha.

O Music360 vai contribuir para a forma como apreciamos e pagamos pela música, garantindo um futuro mais justo e sustentável para os artistas e titulares de direitos.

Dados animadores

Em países onde os trabalhos de campo já estão em curso, os primeiros dados são animadores. Assim, na Holanda procurou-se aferir o impacto nos funcionários de 100 lojas. Verificou-se uma melhoria do ambiente de trabalho quando os empregados tinham uma palavra a dizer na escolha das playlists. Resultado: mais boa disposição, mais e melhor interação com os clientes, mais vendas.

Na Finlândia verificou-se um impacto nas vendas em estabelecimentos que tocaram playlists devidamente curadas e criadas à medida de cada espaço, tendo em conta o negócio e o seu público-alvo. Observou-se também uma melhor performance das playlists compostas por músicas protegidas por direitos de propriedade intelectual quando comparadas com as listas “royality-free”.

Os mentores do Music360 perspetivam efeitos de grande alcance, não só para os artistas, mas também para a perceção pública da música como um elemento sociocultural essencial.

O consórcio reúne entidades de gestão coletiva de direitos de artistas (CMOs) – SENA, BUMA (Países Baixos) IMRO (Irlanda) e GDA, a AEPO-ARTIS (federação europeia de CMOs) – universidades – a Vrije Universiteit Amsterdam (Países Baixos, coordenadora do projeto), Universitat Politechnica de Valencia (Espanha), bem como os agentes do setor GTM (Finlândia), BMAT Licensing (Espanha) e The Value Engineers (Países Baixos). 

Informação aos cooperadores sobre a extinção da PassMúsica

A cobrança de direitos de comunicação pública passou a ser feita exclusivamente pela Audiogest. Metade dos valores cobrados serão entregues à GDA que os distribuirá pelos artistas.

A GDA deixou de ter, a 1 de janeiro de 2022, responsabilidade direta na gestão da cobrança de direitos de comunicação de música gravada em espaços públicos (bares, discotecas, transportes, espaços de comércio, restauração, entre outros).

Essa cobrança passou a ser efetuada exclusivamente pela Audiogest, que representa os produtores discográficos. Metade dos valores cobrados serão transferidos para a GDA, que os distribuirá pelos respetivos titulares.

Estas alterações resultam do facto de a Audiogest ter decidido unilateralmente extinguir a associação que mantinha com a GDA através da PassMúsica, para avançar sozinha para essa cobrança, pondo fim a um modelo de cobrança que vigorou durante 15 anos. Esta decisão mereceu a total discordância da GDA, já que a rutura desbarata um património de investimento, de conhecimento e experiência acumulada.

Esse modelo que associou os representantes dos artistas e dos produtores, constituiu-se como

um caso de estudo internacional e foi precursor do que, posteriormente, viriam a ser as recomendações dos legisladores europeu e nacional para a criação de Balcões Únicos de Licenciamento Conjunto.

Recorde-se que, nos termos da lei em vigor, é aos produtores que, em representação de produtores e de artistas, compete proceder à cobrança desses direitos, ficando obrigados a dividir essa cobrança com os artistas.

A GDA negociou com a Audiogest um protocolo que define rigorosamente os termos em que a GDA acompanha e fiscaliza a atividade de cobrança desenvolvida pela Audiogest.

Exportação da música portuguesa e o Mercado Único Europeu da Música

Apesar da inexistência de fronteiras físicas no espaço da União Europeia, subsistem barreiras invisíveis à circulação de música e músicos. O desenvolvimento de um mercado único europeu da música revela-se fundamental para facilitar a circulação transnacional de obras, artistas e serviços culturais.

Por Bruno Gaminha, diretor de Distribuição e de Sistemas de Informação da GDA

A mais superficial das análises feitas à evolução dos modos de produção, distribuição, consumo e fruição da música concluirá rapidamente que o atual contexto global é marcado por uma circulação intensiva de conteúdos culturais. Paradoxalmente um estudo de 2019 (relatório final: Music Moves Europe – A European Music Export Strategy)[1] indica que em média, apenas, 15% da música ouvida em serviços de streaming na UE provém de países europeus (excluindo o Reino Unido), ao passo que 42% é música originária dos Estados Unidos​.

Até mesmo o repertório britânico ocupa uma fatia maior do que toda a música continental europeia nos mercados da UE. Estes números ilustram a insuficiente circulação das obras europeias no próprio território europeu, revelando um potencial por explorar e uma integração europeia por construir.

Desenvolver um mercado único europeu da música revela-se fundamental para facilitar a circulação transnacional de obras, artistas e serviços culturais. Atualmente, apesar da inexistência de fronteiras físicas no espaço da UE, subsistem barreiras invisíveis que fragmentam o mercado musical.

Diferentes línguas, preferências culturais nacionais e uma viscosidade na circulação da música que resultam numa realidade em que cada país tende a consumir sobretudo a sua produção local e repertório anglo-americano, com pouca troca de repertórios intraeuropeus. Estes argumentos ilustram a insuficiente circulação das obras europeias no próprio território europeu, revelando um potencial por explorar. Um verdadeiro mercado único da música poderia equilibrar este panorama, reduzindo a dependência europeia de importações culturais extraeuropeias e incrementando a difusão recíproca das diversas músicas nacionais.

Para um país de pequena dimensão como Portugal isso significaria multiplicar a audiência alcançável sem sair do espaço comunitário – transformando um mercado doméstico de 10 milhões de pessoas num mercado interno europeu de mais de 450 milhões de consumidores. Obras portuguesas poderiam, assim, encontrar público na Alemanha ou na Suécia com a mesma facilidade com que hoje chegam a Coimbra ou ao Braga. Em última análise, a integração do mercado musical alinhar-se-ia com os princípios fundadores da UE de livre circulação – não apenas de bens e pessoas, mas também de ideias e criações culturais.

Desenvolver um mercado único europeu da música seria, portanto, uma forma de concretizar esse potencial, harmonizando regras e infraestruturas para que a circulação transnacional seja fluida. Além de ampliar as oportunidades para artistas e empresas, tal mercado único contribuiria para afirmar a autonomia cultural europeia num setor hoje globalizado. Em vez de 27 mercados fragmentados, a UE passaria a dispor de um espaço musical unificado e competitivo, apto a dialogar de igual para igual com os grandes blocos globais na promoção dos seus repertórios.

Pilares para a construção de um Mercado Único da Música

A concretização de um mercado único da música requer a construção de infraestruturas robustas em dois níveis: o conceptual, que abrange políticas, financiamento e redes de cooperação; e o físico/tecnológico, que inclui plataformas, logística e sistemas interoperáveis de dados e direitos.

Para um mercado único funcional, os decisores políticos devem assegurar a convergência de regras que hoje variam de país para país: desde as quotas de música local nas rádios, a introdução de quotas de música europeias, aos regimes de incentivo fiscal para produção cultural, até à justa remuneração dos artistas interpretes e executantes pelas utilizações da sua música no contexto digital.

Os modelos de financiamento são outro pilar conceptual. A criação de um mercado musical europeu exigirá investimentos em criação, promoção, formação e inovação.

Finalmente, a rede de cooperação cultural europeia precisa de se consolidar como estrutura de apoio a este mercado único. Um mercado único da música beneficiará de redes permanentes que unam festivais, salas, promotores, editoras e artistas europeus, criando circuitos onde um artista português possa facilmente ter acesso a palcos em Madrid, Berlim ou Estocolmo, e reciprocamente artistas dessas cidades venham a Portugal. Além disso, redes de formação e capacitação ampliariam as competências necessárias para operar internacionalmente, uniformizando conhecimentos sobre mercados estrangeiros, marketing digital ou gestão de direitos. Em suma, a infraestrutura conceptual consiste em alinhar políticas, viabilizar financiamento adequado e cultivar laços de cooperação pan-europeus.

A par das iniciativas conceptuais, a dimensão física e tecnológica da integração do mercado musical requer investimentos e coordenação em várias frentes. Um primeiro elemento central são as plataformas digitais. No contexto do mercado único, idealiza-se um ecossistema digital onde qualquer consumidor europeu possa aceder legalmente ao repertório de qualquer país da UE, sem restrições arbitrárias de catálogo ou localização. Isso implica aprofundar a interoperabilidade entre serviços de música online e talvez desenvolver plataformas agregadoras de conteúdo europeu. Embora serviços globais como Spotify, YouTube Music ou Apple Music já operem na maioria dos países europeus, há oportunidades para criar vitrinas dedicadas à música europeia nestas plataformas – por exemplo, através de secções específicas, playlists editoriais pan-europeias ou sistemas de recomendação que favoreçam descobertas transnacionais e o florescimento da diversidade cultural europeia.

Uma segunda componente física relaciona-se com os centros logísticos e de distribuição. Embora a música gravada hoje circule sobretudo em formato digital, o mercado musical abrange também artefactos físicos e, principalmente, espetáculos ao vivo. Para que haja um verdadeiro mercado único, é preciso facilitar a mobilidade física da música: isto significa simplificar a circulação de artistas e do seu equipamento, otimizar rotas de digressão europeias e até criar infraestruturas e centros de serviços partilhados.

Finalmente, a interoperabilidade tecnológica e de gestão de direitos constitui um elemento crítico desta infraestrutura. A indústria da música baseia-se numa teia complexa de informação (metadados de obras, identificadores, registos de utilização) e num sistema de remuneração de direitos de autor e conexos. Para um funcionamento transfronteiriço fluido, é necessário que os sistemas tecnológicos “conversem” entre si. Isto abrange a adoção generalizada de normas comuns como o código ISRC para identificar gravações, o ISWC para identificar obras, bem como a criação de bases de dados partilhadas ou interligadas a nível europeu. Atualmente, a identificação da origem e titularidade de uma música nem sempre é trivial quando se cruzam fronteiras – por exemplo, um artista português pode gravar em Espanha com uma editora holandesa; garantir que essa faixa seja devidamente rastreada e monetizada em toda a Europa requer sistemas inteligentes e integrados​.  

O papel da tecnologia e a participação da GDA

Na GDA temos estado intensamente envolvidos no desenvolvimento destes sistemas e na construção de uma infraestrutura tecnológica partilhada que permita responder à estratégia de criação de um mercado único europeu de música. O trabalho que temos desenvolvido no âmbito da SCAPR[2] (onde coordenamos o grupo responsável pela evolução e pelos  desenvolvimentos tecnológicos) tem permitido a construção de uma base de dados única mundial para a identificação unívoca de artistas, o IPD – que permite que cada artista interprete ou executante tenha uma identidade partilhável reconhecível em mais de 50 países – e o VRDB, base de dados partilhada por mais de 30 países que permite partilhar repertório (incluindo a lista de todos os músicos intérpretes e executantes que participam  em cada um dos fonogramas) e lista de obras utilizadas e que geraram direitos em cada um dos países.

Também temos estado envolvidos ativamente no desenvolvimento e implementação dos diferentes protocolos DDEX – padrão técnico internacional que codifica o padrão de troca de metadados de música e da coreografia envolvido na troca dos dados entre as diferentes partes interessadas – no nosso sistema de documentação e distribuição, garantindo a interoperabilidade e inclusão do espaço de dados da música portuguesa no ecossistema global de dados e metadados da música.


[1] European Commission: Directorate-General for Education, Youth, Sport and Culture, Factory 92, KEA European Affairs, Le bureau export, Music Austria, Smidt, P., Sadki, C., Winkel, D., Le Gall, A., Saraiva, N., Jacquemet, B., Hergovich, F., Kern, P., Demeersseman, M., Miclet, F., Dorgan, A., Pletosu, T.Sillamaa, V., Music moves Europe – A European music export strategy – Final report, Publications Office, 2020, https://data.europa.eu/doi/10.2766/40788
[2] SCAPR, Conselho das Sociedades para a Gestão Coletiva dos Direitos dos Artistas Intérpretes e Executantes. https://www.scapr.org