Diretiva MUD: GDA apoiará em tribunal os artistas que exijam a receita que lhes é devida pelo mercado digital

A GDA apoiará todas as queixas aos tribunais que músicos, atores e bailarinos queiram interpor se a lei de transposição da Diretiva do Mercado Único Digital (MUD) para Portugal “não deixar claro, preto no branco, que não pode haver artistas sem receber qualquer parcela dos rendimentos que as suas obras gerarem no mercado digital”, afirma Pedro Wallenstein. Com a Diretiva MUD, a União Europeia impõe que o “streaming” audiovisual e de música seja um rendimento justo para intérpretes e executantes.

A GDA avisa o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, e os deputados da Comissão Parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, que apoiará os artistas portugueses nos tribunais se a transposição para Portugal da diretiva europeia dos direitos de autor e direitos conexos para o Mercado Único Digital – a Diretiva MUD – não garantir a todos os intérpretes e executantes um pagamento justo pela utilização online das suas obras.

A Diretiva MUD foi legislada pelo Parlamento Europeu e pela Comissão Europeia para que os artistas, os autores e os órgãos de comunicação social do espaço europeu possam receber um pagamento justo pela utilização online das suas obras (notícias, entrevistas e reportagens, no caso dos média).

A advertência da GDA ao Governo surge na sequência de o Ministério da Cultura ter colocado em consulta pública o Decreto Lei 134/XXIII de 24 de março de 2023 (anterior Proposta de Lei nº52/XV), ou seja, o texto que resultou da “autorização legislativa” que a Assembleia da República deu ao Governo para que seja este, e não o próprio Parlamento como seria natural, a transpor para ordem jurídica portuguesa a Diretiva MUD aprovada em 2019 em Estrasburgo e em Bruxelas (ver Decreto Lei em consulta pública em anexo). Segundo a GDA, o texto da transposição colocado por Pedro Adão e Silva à consulta pública esta semana “trai por completo” os propósitos políticos de justiça e de equidade que estiveram no espírito dos deputados e dos comissários europeus, prejudicando de forma inaceitável os artistas, os autores e os órgãos de comunicação social.

“É totalmente inaceitável que, sob o disfarce da ‘transcrição literal’, o ministro da Cultura subscreva um texto que, na prática, deixará a maioria dos artistas intérpretes, e a totalidade dos artistas executantes, sem receber um cêntimo das receitas que no futuro irão ser geradas no mercado digital pela utilização do seu trabalho!”, afirma Pedro Wallenstein, presidente da GDA. “Caso esta proposta venha a ser transformada em lei, a GDA apoiará juridicamente as queixas de todos os artistas seus cooperadores que queram ir a tribunal reclamar aquilo que a Diretiva MUD explicitamente lhes concede, mas que a proposta de Pedro Adão e Silva não materializa: o pagamento, justo e proporcionado, pela exploração online das suas obras, nomeadamente o ‘streaming’ das obras musicais e audiovisuais em que participem”.

Quando foi aprovada em 2019 a Diretiva MUD passou a garantir aos artistas europeus, no essencial, duas coisas: que aqueles que até então recebiam pouco pela utilização online das suas obras passassem a receber mais, “de uma forma justa e proporcionada”; e que a maioria dos artistas, que nada recebia nem recebe hoje, passasse a receber direitos sempre que as obras em que participa gerassem receitas no online. A Diretiva MUD consagra direitos equivalentes, quer aos autores, quer aos órgãos de comunicação social sedeados na União Europeia.

GDA deixa cair a gestão coletiva de direitos e concentra-se nos pagamentos aos artistas

Segundo Pedro Wallenstein, o texto que o Governo agora colocou à discussão pública não garante nada disso. “Pelo contrário! Trai por completo o espírito da Diretiva e quer perpetuar em Portugal o desequilíbrio atual em desfavor dos artistas, excluindo-os do Mercado Único Digital”. O presidente da GDA repudia ainda a tábua rasa que Pedro Adão e Silva faz dos contributos jurídicos que a GDA lhe fez chegar: estes deixaram de incluir qualquer reivindicação de gestão coletiva de direitos e concentraram-se, apenas e só, nos pontos que podem garantir aos artistas o recebimento de uma parcela, “justa e proporcionada”, do rendimento gerado pelo seu trabalho (consultar Posição da GDA aqui).

“No início, a GDA disponibilizou-se para discutir a possibilidade da gestão coletiva de direitos como uma eventual ferramenta, entre outras, para assegurar a justa remuneração de certos artistas que, sem ela, ficariam excluídos do Mercado Único Digital”, explica Pedro Wallenstein. “Verificámos, no entanto, que outros parceiros – a começar pelo Governo – utilizaram essa questão para ofuscar todas as outras, tentando isso impedir a discussão de todos os outros pontos: o pagamento aos artistas, mecanismos de transparência, recurso a arbitragem, etc”.

É por esta razão – por agora estar exclusivamente centrada em garantir que todos os artistas poderão receber o que lhes compete – que a GDA irá mobilizar recursos para apoiar os artistas portugueses nos tribunais. “A GDA apoiará a preparação de todas as queixas que os artistas portugueses queiram entregar nos tribunais se o texto final da transposição da Diretiva MUD para Portugal não deixar claro, preto no branco, que não pode haver artistas sem receber nenhuma parcela dos rendimentos que as suas obras gerarem no mercado digital”.        

O Estado português já é objeto de um processo de infração movido por Bruxelas por não ter transposto em devido tempo, há mais de dois anos, para a ordem jurídica nacional a legislação europeia que garante que a exploração online – nomeadamente o “streaming” – das obras musicais e audiovisuais seja uma fonte de rendimento justa e proporcionada para todos os artistas, intérpretes e executantes titulares de direitos.

O Parlamento Europeu e a Comissão Europeia legislaram precisamente para tornar equilibrada e minimamente justa a repartição das receitas do mercado digital – tanto em relação aos artistas, como em relação aos autores e aos órgãos de comunicação social, sublinha Pedro Wallenstein. “A proposta do ministro Pedro Adão e Silva deixa tudo na mesma e trai escandalosamente os propósitos genuínos e justos da Diretiva MUD para o espaço europeu.”

Pode ver a Consulta Pública do Decreto Lei 134/XXIII de 24 de março de 2023 (anterior Proposta de Lei nº52/XV) aqui.