Diretiva Europeia sobre mercado digital “perpetua injustiças na remuneração dos artistas”

Pedro Wallenstein, presidente da GDA, denuncia que a proposta em discussão no Parlamento Europeu não protege o pagamento dos artistas pela utilização das suas obras na internet. Numa altura em que as previsões apontam para um crescimento das receitas do streaming de música da ordem dos 500%, nos próximos 12 anos, a entidade que representa os artistas em Portugal defende que a “diretiva em discussão tem de consagrar o direito irrenunciável de os artistas obterem uma remuneração pela utilização do seu trabalho nas plataformas digitais”.

A proposta de Diretiva Europeia sobre o Direito de Autor no Mercado Único Digital, presentemente em discussão no Parlamento Europeu, não consagra a proteção dos artistas, perpetuando uma situação em que favorece as grandes empresas que exploram as plataformas de streaming e de download, denuncia a GDA – Gestão dos Direitos dos Artistas, a entidade que em Portugal gere os diretos de propriedade intelectual de músicos, atores e bailarinos.

Segundo o presidente da GDA, Pedro Wallenstein, “o documento não responde ao grande problema do não pagamento aos artistas pela utilização das sua obras na internet”. Isto porque “as plataformas que colocam a música à disposição dos utilizadores na internet poderão continuar a excluir os artistas da distribuição das receitas geradas pela utilização do seu trabalho na web”.A proposta sobre o Direito de Autor no Mercado Único Digital, em discussão no Parlamento Europeu, foi apresentada pela Comissão Europeia de 14 de setembro de 2016. Na altura, o presidente da Comissão, Jean-Claude Juncker, falou da necessidade de proteger as partes mais desfavorecidas. Porém, a proposta de articulado agora em debate é omissa em relação à proteção dos artistas. “Ou seja”, afirma Pedro Wallenstein, “em nada se altera a situação desastrosa que é vivida pela maioria dos artistas da música e do audiovisual, tendendo a perpetuar a inconcebível realidade desta nossa era digital: um artista recebe direitos sobre a difusão da sua obra pelas vias tradicionais – rádio ou televisão, por exemplo – mas não recebe nada quando essa mesma obra é difundida através das plataformas legais de streaming e de download”.Nesta ocasião, a AEPO-ARTIS, a associação internacional por uma Internet Justa, da qual a GDA faz parte, declarou que o diploma proposto ignora por completo as preocupações de mais de 500.000 músicos, cantores, atores, bailarinos, guionistas e realizadores, evidenciando “pouca ou nenhuma preocupação” com o seu fraco poder negocial face à indústria. Segundo a AEPO-ARTIS, trata-se de manter a presente situação de favorecimento da indústria em detrimento dos artistas.

Após os anos em que as plataformas legais de streaming e de download se afirmaram como um mercado emergente, tornaram-se depois numa indústria fortíssima, constituindo hoje a forma mais comum de consumir, filmes ou séries.

Só na indústria musical, o streaming pago deverá registar, nos próximos 12 anos, um crescimento das receitas de cerca 500 %, atingindo os 28 mil milhões de dólares, de acordo com um estudo recente da Goldman Sachs. É por isso que a GDA e as suas congéneres europeias se empenham tanto para que as atuais condições em que se celebram os contratos entre artistas e a indústria sejam alteradas.

“No estado atual das coisas, os artistas são a parte mais fraca da cadeia de valor”, afirma Pedro Wallenstein.O que se tem verificado é que, em muitos casos, os artistas abdicam contratualmente dos seus direitos ou do seu exercício, sem plena consciência das consequências e implicações do que estão a fazer. “É essa a principal razão pela qual a negociação desses direitos deve ser coletiva”, afirma o presidente da GDA.

Combater as formas como os artistas são atualmente espoliados dos seus direitos de propriedade intelectual pela parte mais forte no processo negocial – a indústria – é, para o presidente da GDA, a principal prioridade nesta matéria, uma vez que esta é a injustiça fundamental de que a maioria dos artistas da música e do audiovisual é vítima.

“Chegámos a um momento crucial em que a União Europeia teria a oportunidade de conciliar os interesses da indústria com os dos criadores e intérpretes, sem que nenhuma parte prevaleça sobre a outra”, diz Pedro Wallenstein. “Será profundamente negativo para a comunidade artística europeia, e de todo o mundo, se essa oportunidade for desperdiçada”.

Na perspetiva da GDA, já há demasiados criadores e intérpretes que não conseguem viver do rendimento do seu trabalho, não se tratando apenas de um problema de carreiras. A atual situação desencoraja os mais jovens a ingressar nas profissões criativas, empobrecendo a produção cultural. Ora, conclui Pedro Wallenstein, “se a cultura é importante na Europa, a questão da remuneração justa dos artistas pela utilização do seu trabalho tem de ser resolvida de forma efetiva, ou seja: a diretiva em discussão tem de consagrar o direito irrenunciável de os artistas obterem uma remuneração pela utilização do seu trabalho nas plataformas digitais”.